domingo, 15 de julho de 2012

Só beleza não basta (II)


      Em crianças aprendemos que a beleza é fundamental. Temos de tomar banho, escovar os dentes, pentear os cabelos, etc., para ficarmos “bonitinhos”, dizia a nossa Mãe, a Tia, ou os Amigos. Isto porque no mundo ocidental, o conceito de beleza esteve sempre ligado ao conceito de qualidade. Tudo o que é belo é bom...
      Foram feitas várias pesquisas e sempre ficou cabalmente demonstrado que os belos e as belas têm mais oportunidades de sucesso. Uma dessas pesquisas revelou, por exemplo, que os bebés olham mais tempo para as pessoas bonitas! Entre as raparigas e os rapazes, os sorrisos e os gestos de simpatia são sempre, mais ou menos, diretamente proporcionais à maior ou menor beleza irradiada, pelo sujeito contemplado...
      No mundo do trabalho profissional também não é diferente. São factores importantes de selecção e ascensão na carreira, além dos específicos, a demonstração de que nos conduzimos segundo os conceitos – padrão, atuais de beleza. Precisamos de ser vistos pelos outros como estando na média das médias e, por isso, não podemos destoar...
      A psicóloga Nancy Edok, no seu trabalho sobre o belo, lembra que, actualmente, o padrão de beleza física é multirracial. Por outro lado acrescenta que, apesar da multiplicidade de recursos disponíveis para conseguir a excelência da forma física, ela se revela insuficiente. As pesquisas mais recentes e mais profundas mostram que a tendência é procurar no semelhante inteligência, generosidade, fidelidade e optimismo, sublinhando que a beleza física da pessoa, a aparência, não é tudo mas sobretudo, deverá ser valorizada como ser humano.
      Conta-se numa determinada obra literária que a protagonista, Marieta, pergunta ao cego a quem serve de guia se ele sabe distinguir o dia da noite. O cego responde: “É dia, quando nós estamos juntos; é noite, quando nos separamos”...
      Marieta, é uma jovem deformada por um acidente sofrido quando era criança. Apenas o seu amigo cego podia ver a beleza do seu interior, sem se limitar à superficialidade do seu corpo deformado. A cegueira dos olhos físicos era o princípio da luz dos seus olhos interiores para ver os outros. Não julgava pela impressão sensível. Julgava pela beleza segundo a estatura moral da pessoa...
      Uma interessante forma de apreciar o mundo! Uma lição serena para esta sociedade ocidental tão angustiada pelo cuidado estético e, paradoxalmente, tão superficial no cultivo da interioridade...
      Reconhecemos que é difícil esquecer a aparência. Inquietam-nos os primeiros cabelos brancos, as rugas, etc., porque, no fundo também nós identificamos juventude e beleza, porque a nossa bandeira estética também se reduz, de algum modo, à margem do superficial e sensível. Onde está a luz do dia interior de que fala o cego? Por que não a vemos? Não será porque esta luz deve ser procurada com olhos interiores, em silêncio e na quietude que permite ver o invisível, que é realmente valioso? 
      É necessário saber olhar bem: O rosto de uma pessoa que foi marcado por numerosas tormentas da vida pode ser belo. Seja qual for a sua idade, a beleza de uma mulher que resistiu às dificuldades, brilha com um esplendor que se destaca. Porque o decorrer silencioso dos anos engrandece aquela que viveu em ordem ao “dar-se” e não ao “ procurar-se”...
      É por tudo isto, que muitas vezes temos deparado com rostos atractivos de mulheres anciãs que irradiam algo que não se “vende” no século XXI: uma beleza pacífica, serena. Uma beleza que cresce, porque o tempo aquilata e purifica o que nos faz grandes: a capacidade de amar que possui o ser humano.
      E o amor não é uma maquilhagem que se tira de noite; é antes uma marca indelével que não se apaga com o tempo. Essa marca, a beleza interior, é uma moda que não passa!


Maria Helena H. Marques

Professora do Ensino Secundário


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